Não estamos muito longe de completar dois anos de Canadá e posso dizer que já estamos 99% adaptados e resolvi juntar algumas coisas que postei anteriormente e outras que ainda não postei mostrando o choque cultural que sofremos ao chegar aqui.

Idosos

No Brasil o idoso é, via de regra, um coitado. Trabalhou a vida inteira igual um miserável, mas quando se aposenta não consegue ter uma vida digna. Por lá idoso raramente sai de casa pra passear e sempre que isso acontece é acompanhado de filhos/netos.

O dinheiro da aposentadoria mal dá pros remédios e muitos deles acabam tendo que trabalhar em alguma coisa – nem que seja vendendo bala no farol – para se sustentar.

E, pra variar, o governo ao invés de uma solução dá esmola. Já que idoso não tem condições de ter carro vamos deixar andar de ônibus de graça. E ao invés de dar condições de saúde vamos deixar ele passar na frente na fila do mercado. Pronto. Isso deve resolver.

Aqui os idosos estão em todo lugar. Literalmente. Saindo por ai você encontra os idosos aos montes em shoppings, fast-foods, boliches, restaurantes, lojas de departamentos, parques. E só vez por outra estão acompanhados de família. Normalmente estão acompanhados de outros idosos.

Achei muito engraçado um dia que fomos no Arby’s e tava tendo encontro de um clubinho de idosos. Todos os homens no estacionamento, com carros antigos e clássicos em perfeito estado, discutindo sobre motores, pneus, etc. E quando entramos no restaurante as esposas todas do lado de dentro, comendo e conversando sobre o que quer que seja que mulher converse.

A esposa trabalha numa loja de departamentos e me conta que todo dia tem idoso gastando fortunas lá. E eles não tem restrições. Achei engraçado um dia que cruzamos com um casal de velinhos num jaguar e na placa da frente lia-se “Estou gastando a herança dos meus filhos”.

Deficientes físicos

No Brasil a integração dos deficientes no dia-a-dia ainda está muito longe da realidade. Seja pela dificuldade de transporte, acesso nos prédios ou aceitação da sociedade. Por algum motivo assume-se que alguém que ficou paraplégico também ficou retardado. Mas lógico que ninguém fala isso.

Além disso ser deficiente no Brasil deve ser extremamente desagradável também até para frequentar os lugares. Quando eventualmente aparece uma pessoa de cadeira-de-rodas num estabelecimento vira imediatamente o centro das atenções. Todo mundo fica meio que desconfortável – como se fosse uma doença contagiosa – e alguns menos educados ficam encarando o deficiente. Deve ser horrível.

Aqui no Canadá todas (realmente TODAS) as calçadas são corretamente adaptadas para deficientes. Pelo menos aqui em Halifax 95% de todos os ônibus (não disse linhas. Disse ônibus.) são adaptados também. As poucas linhas que não tem adaptação tem um serviço de shuttle onde eles mandam uma van buscar os passageiros.

Uma coisa que eu nunca pensei (por não ser deficiente) é como deve ser complicado abrir a porta de um estabelecimento sendo cadeirante. Notei isso porquê aqui 100% das lojas tem um botão para abertura automática da porta para deficientes. E todas os locais com elevação tem rampas e/ou elevadores.

E os deficientes físicos, assim como os idosos, estão em todos os lugares. OK, nunca vi um jogando boliche… Mas isso é detalhe.

O melhor de tudo, que deve ser o sonho de consumo dos deficientes brasileiros, é que eles são tratados exatamente como qualquer outra pessoa. O fato de ter tantos andando por ai tira aquela sensação de uma pessoa estranha no meio.

Diversidade

No Brasil uma empresa que tem mais de 40% de mulheres no quadro de funcionários já se julga um exemplo de diversidade. Se tiver algum gay então, vira até notícia na correspondência pra funcionários. E não tem muito mais do que isso.

Por lá as raças já se misturaram faz tempo. Apesar de eventualmente você ver alguém que notadamente pertence a uma certa etnia, no geral as pessoas tem aquela cara de brasileiro, que não é cara de raça nenhuma no mundo.

Aqui no Canadá é diferente. Tem muitas etnias e pouca mistura. Eu acredito que seja por dois motivos: Primeiro que o país é muito novo (142 anos) e não deu tempo ainda de misturar muito e depois que a imigração ainda está acontecendo hoje.

Na empresa com mais “diversidade” que trabalhei no Brasil fiz parte de um projeto onde tinha uns 120 brasileiros e 2 alemães da nossa parte. Da parte do cliente tinha uns 3 americanos, um argentino e um suiço. Ou seja: numa equipe de quase 130 só 7 não eram brasileiros.

Onde estou hoje, pra falar só dos que eu sei, somos uma equipe de 36 pessoas. Temos um brasileiro (eu), uma colombiana, um inglês, um do leste europeu (pelo que ele me contou o país onde ele nasceu não existe mais hoje), um iraniano e um chinês. Um sexto da equipe é estrangeira.

Um outro dia passando em frente a uma sala de aula me peguei pensando: Nunca no Brasil eu iria ver uma cena assim. Na primeira fileira da sala tinham 4 alunos sentados: Um bem branquinho e loiro, um negro bem escuro, uma mulher árabe vestida numa burca (só os olhos de fora) e uma asiática com cabelo cor-de-rosa. Caracas… onde no Brasil você ve isso?

E fora que brasileiro não tem a menor sensibilidade com outras culturas, né? Qual o primeiro lugar que querem levar um indiano que vem integrar parte de um projeto? Churrascaria. E o que perguntam pra uma mulher árabe? “Esse negócio ai não dá calor não?”. E o que falaram pra americano? “Hambúrguer num churrasco? Vocês são ruinzinho mesmo, hein?”.

Não posso negar que já tentei fazer um mexicano comer creme de abacate no Brasil, ao mesmo tempo que não suporto a idéia de abacate como parte de uma refeição salgada.

Aparência não conta

Chega a ser irritante no Brasil como a aparência importa. Me lembro de um caso que  uma professora que tive na faculdade contou. Depois de passar o dia fora de casa com alguma atividade com os filhos pequenos ela decide dar uma parada no shopping pra comer um lanche com as crianças. Lógico que ela não estava com suas melhores roupas, nem estava limpa, cheirosa ou maquiada. Mas ela passa em frente a uma loja e vê uma roupa que gosta muito e decide comprar. Ela entra na loja e pergunta: Você tem tamanho M dessa roupa? A vendedora responde: Isso custa 300 reais, bem.

O resto da conversa não interessa, você já entendeu a idéia.

Aqui se você vai em qualquer lugar vestido de qualquer jeito será sempre tratado da mesma forma. Na fila do Tim Horton’s vai ter gente de terno, gente de calça jeans e gente de macacão, cinto de ferramentas e capacete de obras, todos sendo atendidos do mesmo jeito.

Pra mim é ótimo, pois eu passo longe de ser elegante. Pro desgosto do meu pai eu vou no banco, na concessionária de automóveis, no advogado, na igreja ou pro serviço de tênis, calça jeans e camiseta. E nunca tive nenhum tipo de rejeição ou problema.

E por falar em mim, mais uma prova que aparência não importa: Tente ir numa loja de departamentos ou numa loja “de marca” no Brasil e comprar uma roupa XGG. Boa sorte. Se você não está entre P e GG (ou algumas lojas entre P e G) você tem a aparência errada. Você não pode se vestir como todas as outras pessoas “normais”.

No Brasil eu precisava comprar roupas em loja de gordo, que enfia a faca sem dó. Lembro que uma camiseta custava perto de 50 reais.

Aqui eu compro minhas camisetas em qualquer loja, mas normalmente fico entre Wallmart e Zellers, onde posso pagar entre 4 e 10 mangos apenas. Eu normalmente uso 2XGG, mas facilmente encontra-se até 4XGG em qualquer loja.

Educação

Não é o título correto, mas não sei como chamar essa sessão.

A regra aqui é basicamente o seguinte: Arrotar é válido. Em qualquer lugar, em qualquer momento, na presença de qualquer um. Só não esqueça de dizer excuse me depois.

Já vi gente arrotando desde restaurante até em reunião com diretoria. Mas só um excuse me livra a barra do mais grutal dos arrotos.

Por mais estranho que pareça, se você espirra também deve perdir perdão, mas tossir passa batido. Não precisa justificar não. Vai entender.

Eu até tinha mais coisas pra falar, mas a preguiça tá forte. Hoje estou de folga, então chega…