Comentei aqui e no twitter sobre o incêndio que teve aqui em Halifax e achei que um follow-up ia ser necessário.

Pra começar um pouco sobre a cidade: É extremamente tranqüilo por aqui. Raramente alguma coisa (qualquer coisa) acontece e quando tem alguma emoção – como um taxista que desapareceu e foi encontrado morto meses depois ou uma briga de traficantes com 1 morto e 2 feridos – é assunto pra mais de mês.

Sempre vamos para o serviço ouvindo notícias no rádio e a hora de mais tensão no noticiário matinal é de quinta-feira, para saber se a gasolina vai subir ou descer no dia seguinte.

Tendo isso em vista já imaginam o fuzuê que fizeram com esse incêndio. A imprensa caiu BABANDO em cima, afinal sangue é o que vende jornal, né? Mas coitados… nem assim.

Na sexta de manhã estava ouvindo o jornal, que linkou ao vivo de um centro comunitário que estava sendo usado como centro de desabrigados e posto de comando para gerenciamento da crise. O repórter dizia:

– Uma situação horrível aqui! Milhares de pessoas desabrigadas, sem poder voltar para casa. Ruas fechadas, bloqueios policiais… um verdadeiro caos.

Ai começa a parte engraçada (pelo menos pra mim – ênfases em negrito minhas):

– Apesar das inúmeras casas evacuadas felizmente a maioria das pessoas conseguiu hospedagem na casa de família e amigos. Muitos outros simplesmente foram para algum hotel. Mas eu estou aqui com um homem que precisou passar a noite inteira aqui. Sr. Fulano, ouvi dizer que o sr. saiu às pressas de casa, sem nem conseguir pegar seu medicamento. Que coisa horrível, hein?

– Foi sim, viu? Mas o pessoal da Cruz Vermelha já me conseguiu mais medicação.

– (Voz de decepção) Ah… Mas o sr. deve estar muito cansado, né? Deve ser horrível ter que passar a noite num centro de desabrigados.

– Olha, até que não foi não, viu? Tinha uns cobertores melhores que os lá de casa, viu? E olha, de hora em hora passava o pessoal da cruz vermelha pra ver se tava tudo bem comigo.

– (Voz de decepção ++) Ainda bem, né? Mas e a sensação de abandono e solidão?

– De jeito nenhum viu? Até o prefeito veio conversar comigo ontem de noite.

– (Voz de Own3d) Obrigado sr fulano. Voltamos aos estúdios.

Deu até dó do repórter. Ele querendo espremer um pouco de desgraça humana para render uns pontinhos de audiência e o nego achando que o cobertor do centro de desabrigados era melhor que o da casa dele. Mas ele não se deu por vencido e no final do dia ouço de novo outro link ao vivo:

– Eu estou aqui com um homem cuja casa perdeu-se totalmente. Não sobrou nada! Sr fulano, o que aconteceu?

– Infelizmente o fogo atingiu em cheio minha casa, né? Só consegui salvar uns documentos.

– Nossa! Que desgraça. E eu ouvi falar que o sr. é músico. O que o sr. perdeu na casa?

– Ah, eu tinha uma coleção de guitarras clássicas enorme, né? Perdi todas. Não sobrou nada da casa, nem meus carros.

– Nossa! Queimaram seu carros? Que modelos que eram? (tadinho, né? vai andar de ônibus agora)

– Um porsche e um corvette!

– (Voz de “filha da p*. Não sabia que tava entrevistando um playboy”) Ah… que desgraça então, né? Perdeu tudo na vida?

– Não, não. Só o que estava nessa casa. E tudo tinha seguro.

– (Own3d de novo) OK, obrigado. De volta aos estúdios.